A dívida de cada torcedor em nome de seu clube do coração

por Emerson Gonçalves

Houve um tempo, que hoje parece distante, mas ainda é recente, que era moda os políticos gritarem nos palanques que cada brasileiro já nascia devendo sei lá quantos dólares. Era o tempo em que a dívida externa era um bicho-papão que a todos apavorava. Hoje, não apavora, embora algum medinho fosse bom.

O post de hoje é sobre dívida, sim, mas não externa, embora algumas coisas até se caracterizem como tal. Vamos falar de quanto cada grande clube brasileiro deve e quanto isso representa para cada um de seus torcedores. Esse trabalho foi preparado pela Pluri Consultoria e seus valores diferem dos que este Olhar Crônico Esportivo usualmente levanta. Como outros profissionais, os analistas da empresa basearam-se nos valores dos passivos dos clubes. Particularmente, prefiro trabalhar com esses valores expurgados de algumas contas que são, na verdade, despesas correntes futuras. Caso não se realizem, não deixarão dívidas ou isso ocorrerá somente em parte como os direitos de imagem a pagar, por exemplo.

O caso do Atlético Mineiro
Já vou destacar no texto o valor da dívida do Galo, para evitar comentários criticando o trabalho. Vários analistas têm dito que a dívida do Clube Atlético Mineiro corresponde ao valor lançado nesse estudo da Pluri 528 milhões de reais ou próximo disso. Entretanto, como mencionado no post O endividamento dos clubes brasileiros Ano-fiscal 2010, o valor real era de 316,1 milhões de reais em 31 de dezembro de 2010. O grosso da diferença, pouco mais de duzentos milhões, é um valor lançado no Passivo depois da reavaliação do patrimônio do clube, feita em 2010, e corresponde ao montante de impostos que serão pagos no caso de hipotética venda futura desse patrimônio. Tecnicamente, é um item do Passivo, mas na prática não se configura como dívida, tanto na minha avaliação leiga, como também na avaliação dos analistas da Parker Randall.

Levando em conta esse número, a cada torcedor do Galo corresponderia uma dívida de 63 reais, em quarto lugar, ao invés de terceiro, na tabela que veremos um pouco mais adiante.

Por outro lado, o Fernando Pinto Ferreira, que liderou a realização desses trabalhos, disse-me que, embora caiba essa ressalva, cabe também o apontamento dessa eventual futura despesa tributária, pois o clube reavaliou seu patrimônio visando colher frutos de uma melhora de seu balanço patrimonial em uma perspectiva mais ampla.

Então, torcida do Galo, ficamos assim: pensando em termos futuros ou numa escala maior, envolvendo uma possível utilização do patrimônio (nem que seja somente para melhorar a ficha cadastral), vale o número mais alto, agora com sua explicação correspondente. Para a vida diária do clube e do time de futebol, considerem o segundo valor como mais correto ou mais próximo da realidade. Apesar disso, não vou mudar o trabalho do trabalho.

Quanto deve cada torcedor de nossos grandes clubes
Fontes… As fontes para esses números são os balanços dos clubes e as pesquisas sobre torcidas do Datafolha e do IBOPE. Sugiro a todos uma leitura do rodapé da primeira tabela. E, falando na dita cuja, vamos a ela:

A tabela mostra que o tamanho da torcida tem, como é natural e era esperado, um forte peso na equação. Partindo desse ponto, fica claro que clubes com dívidas elevadas e torcidas pequenas precisarão ter gestões extremamente eficientes na tarefa de arrecadar recursos junto a seu público alvo. Na verdade, essa necessidade também é válida para os clubes de grandes torcidas, pois, apesar da paixão dos torcedores, os recursos precisam ser buscados junto aos consumidores, ou melhor, junto aos torcedores.

Como pode ser visto no post deste Olhar Crônico Esportivo citado anteriormente, a maior parte dessas dívidas, na média, corresponde a débitos tributários que estão, ou deveriam estar, cobertos pelo acordo dos clubes com o governo federal que levou à criação da Timemania. Tirando algumas exceções, os clubes pouca atenção e valor dão a essa loteria, que não por coincidência, mas não só por causa disso, vem patinando desde sua criação.

Esse último gráfico apresenta um quadro preocupante, embora já bem conhecido: os 4 grandes clubes cariocas concentram nada menos que 45% do total das dívidas dos vinte clubes considerados. É interessante notar que, embora a população do estado do Rio de Janeiro fosse de 16 milhões de habitantes (2010), a soma dos torcedores dos quatro clubes atinge 47,3 milhões de pessoas, equivalentes a 34% do total da torcida dos vinte clubes considerados nesse estudo, demonstrando a grande dispersão pelo Brasil que têm as torcidas dos quatro grandes cariocas. Para efeito comparativo, a população de São Paulo era de 41,3 milhões de pessoas e a soma das torcidas dos quatro clubes listados nesse estudo atingia 59,4 milhões de torcedores, equivalentes a 42% do total das vinte torcidas.